Nasce um observador
Evandro Teixeira de Almeida - como foi nomeado por seus pais - nasceu na cidade de Irajuba, na Bahia. Desde cedo, sua proximidade com a fotografia foi motivo de admiração de quem o via. Durante sua época na escola, aprendeu a manusear a câmera e, dada sua desenvoltura, concentrava outros pequenos à sua volta para mostrar-lhes como era a sua atividade favorita.
Passaram-se poucos anos para que se iniciasse seus trabalhos no mercado profissional. Aos 13 anos trabalhou no jornal Rio Novo. Aos 17, chegou ao Diário de Notícias. Com 21 anos, fotografou para o Diário da Noite. Aos 24, para a Mundo Ilustrado.
Mas o período mais notável da sua carreira, que se iniciou aos seus 27 anos em 1963, foi também o mais longo e abrigou os seus principais trabalhos. Durante sua estadia de 47 anos no Jornal do Brasil - o JB, um dos veículos de maior renome da época -, teve a oportunidade de documentar episódios marcantes da história brasileira. Por estar em um veículo de tal importância seu trabalho pode não só servir como mero conteúdo do JB, mas principalmente como documentação histórica. Iniciava-se então o legado de um dos maiores fotojornalistas do Brasil.
Os anos de chumbo
Muitos estudantes devem ter se deparado com alguns de seus trabalhos, porém sem saber quem foi o autor da captura. Para aqueles que estudam a grade curricular básica da escola através de livros didáticos, suas imagens podem ser encontradas ilustrando episódios da história brasileira, como o período da ditadura militar. Uma de suas fotografias mais conhecidas sobre esse episódio — se não a mais conhecida — é a que leva o nome de Caça ao Estudante.
Caça ao estudante, Sexta-feira Sangrenta. Rio de Janeiro, RJ, 21/6/1968. Evandro Teixeira de Almeida/Instituto Moreira Salles.
Apesar do controle dos estados chileno e brasileiro, sua produção encontrava caminhos que o driblavam, possibilitando que a história fosse registrada. O banheiro do quarto de hotel onde se abrigava se tornava o laboratório onde os episódios eram fixados em papel. O ampliador no cômodo escuro se complementava com os químicos da revelação e fixação. A situação não era a ideal, porém eram necessários esforços para que o trabalho fosse realizado. No momento do flagrante, Teixeira também, como é o caso da Sexta-feira Sangrenta, que, após o clique, os policiais notaram sua presença e passaram a perseguir o fotógrafo, que teve de correr para escapar dos agentes.
Em um outro episódio, a sua sociabilidade foi crucial para que seu trabalho fosse realizado. No caso da noite da Tomada do Forte de Copacabana, a sua entrada foi facilitada por um amigo seu, que era militar de alta patente. Ao notar uma movimentação anormal, o fotógrafo recebeu uma indicação de seu companheiro, que o acompanhou até a entrada da base, seguindo todos os procedimentos padrão de um membro do exército, como bater continência e seguir o pelotão. Já infiltrado, ali pôde registrar detalhes do que viria a ser o marco zero de um dos períodos mais longos e conturbados da história brasileira. Sua presença foi tão sutil que até mesmo o general Castelo Branco acreditou ser um fotógrafo do próprio exército.
Momentos como esse puderam chegar ao conhecimento atual justamente pela sua capacidade de registrar momentos importantes em condições oportunas. O registro desses episódios possivelmente não ocorreria caso não houvesse esses esforços ou se simplesmente não estivesse próximo à ação no momento propício, como avalia Wagner Souza e Silva, professor de jornalismo visual da Universidade de São Paulo (USP). “O perfil do fotojornalista é ir atrás do acontecimento. Ter percebido alguma coisa e ter entrado no forte de Copacabana naquela noite já mostra esse perfil [do Evandro] de estar próximo do que está acontecendo e de alguma maneira tentar sintetizar isso.”
Golpe Militar no Brasil. Tomada do Forte de Copacabana. Rio de Janeiro, RJ, às 5h da manhã, 01/04/1964. Evandro Teixeira de Almeida/Jornal do Brasil.
Além do noticiário
Há também várias fotos que não estão necessariamente relacionadas ao fotojornalismo de hard news. Em muitos casos, o foco foi direcionado aos personagens da cultura brasileira ou até mesmo à nossa população.
A presença da Rainha Elizabeth II do Reino Unido na inauguração do Museu de Arte de São Paulo (MASP) foi mais um episódio capturado graças à sua destreza. No momento do clique, Evandro conseguiu encaixar sua câmera no interior do carro em que estava a monarca. Após o clique, porém, foi empurrado ao chão pela escolta da rainha e acabou quebrando seu cotovelo. Apesar do prejuízo, a foto não foi perdida, possibilitando que o registro chegasse à atualidade.
Durante os mesmos 11 dias de visita da rainha ao Brasil, outros momentos também foram registrados, como o encontro com o Rei brasileiro, Edson Arantes do Nascimento, Pelé.
Evandro Teixeira/ Instituto Moreira Salles
Rainha Elizabeth II e Pelé, Estádio do Maracanã. Rio de Janeiro, RJ, 11/11/1968. Reprodução/Evandro Teixeira.
Em seu livro Canudos: 100 anos ele retrata um cenário diferente do intenso cotidiano jornalístico. Existe uma certa proximidade do autor com o tema, já que a realidade sertaneja era presente tanto em Canudos quanto em sua cidade natal, Irajuba. As pessoas em questão são moradores em seus ambientes. A sua vivência na região pode ter contribuído para um olhar mais aguçado aos detalhes da região. A obra é marcada principalmente pelo sertanejo, o semiárido e a fé.
“O trabalho dele tem uma pureza de olhar. Ele encara o diverso de um modo muito natural. Nas fotos dele, você vê um respeito para com os negros, para com o sertanejo, para com o estudante e sentiu que a missão dele era muito importante como resistência.” analisa Atílio Avancini, professor de jornalismo visual da Universidade de São Paulo.
No campo das artes, Evandro foi próximo de diversas personalidades, como é o caso de Chico Buarque, Tom Jobim e Vinícius de Moraes. A tríade que estava nos seus anos de ouro também teve seus momentos registrados. Na foto em questão, era o aniversário de Vinícius, o que, dada a ocasião, causou um certo desinteresse dele com a presença do fotógrafo. Após muita insistência, Vinícius chamou os outros dois para deitarem sobre a mesa. A foto estampou a matéria sobre o aniversário do poeta para o Jornal do Brasil.
Contemporaneidade e acervo
Atualmente, sua obra se encontra preservada pelo Instituto Moreira Salles - o IMS - na avenida Paulista. O mesmo Instituto abriu uma exposição cujo tema é a sua visita ao Chile. Apesar do título –- Evandro Teixeira, Chile, 1973 —, há fotos de todos os momentos da sua carreira, principalmente as capturas daqui no Brasil. A exposição está disponível para visita até o dia 30 de julho.
No ano de 2020, ele venceu o Prêmio Jabuti — a premiação literária mais importante do país — na categoria “Artes” pelo seu livro “Evandro Teixeira: Instantâneos da história”. Isso mostra que, apesar de sua idade avançada, Evandro Teixeira continua sendo um dos mais importantes fotógrafos brasileiro, e sua obra é reconhecida pela sua contribuição à documentação da história do país.
Jônatas Fuentes
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